quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

os atores



Para Roberto Gómez Bolaños, um jovem mexicano de mente ao mesmo tempo criativa e metódica, que cresceu feliz, mesmo enfrentando com sua família duras crises de uma classe pouco favorecida da sociedade mexicana, a arte foi a sua vida, sua grande  
paixão e também sua razão. 

Chespirito com os irmãos e sua mãe Elsa
Aos seis anos, perdeu o pai, de quem herdou suas aptidões artísticas. Francisco Gómez Linares era um mestre das artes plásticas. Sua mãe, Elsa Bolaños, teve de se virar sozinha com os três filhos - Francisco, Roberto e Horacio. A família passou por dificuldades financeiras. No entanto, Roberto conta que sua infância, apesar de tudo, foi muito feliz. Nunca teve brinquedos eletrônicos, porém nunca lhe faltou uma bola. Certamente, Chespirito e seus irmãos cresceram fazendo aquilo de que ele mais entende: muita arte! De modo que ele pintava o sete... E apanhava!

Para trilhar um caminho tão bem sucedido, Chespirito não contava apenas com criatividade; para ele, isso não basta. Um de seus maiores ensinamentos é que o êxito se faz com 10% de inspiração... E 90% de transpiração! Ou seja, é necessário muito trabalho  
para colocar em prática as boas ideias.

Ramón Valdés em ação em "Simbad, el Mareado" (1950)
Que que foi, que que foi, que que há? Seu Madruga foi o primeiro de todos do elenco a iniciar carreira artística. Claro, praticamente toda a sua família era artista! Seu irmão mais velho, Germán Valdés, conhecido como Tin Tan Valdés, já era, nos anos 40, um dos atores de comédia mais famosos do México. A fama de Tin Tan só cresceria nas décadas seguintes e ele se tornaria um verdadeiro "Titã" da comédia latina. Ramón o acompanhou em dezenas de filmes, até ser convidado por Chespirito para fazer televisão.

Em 1959, apostando no talento de seu irmão Ramonzinho, ou melhor, "Monchito", Tin Tan o convidou para viver o personagem Willy em seu filme "Calabacitas Tiernas". Ramón se saiu bem e foi convidado para outro filme de Tin Tan: "Soy Charro de Levita". Foram só os primeiros dos mais de 50 filmes
 em que Ramón atuaria. 
Don Ramón Gómez Valdés y Castillo, ou simplesmente "Seu Madruga" nasceu em 2 de setembro de 1923, na Cidade do México. Ainda aos dois anos, mudou-se com a família para Ciudad Juarés, Chihuahua. Foi lá que ele começou a seguir os passos do irmão artista. 

A jovem Angelines Fernandez
A Bruxa do... Digo, a Dona Clotilde começou no teatro em 1950, aos 28 anos, no espetáculo "Un Corazon com Freno y Marcha Atras". Angelines Fernández Abad nasceu em 9 de julho de 1922, em Madri, na Espanha (claro, afinal a Espanha é a capital de Madri...). Para fugir da ditadura espanhola, em 1947, foi para o México, onde se naturalizou, tornando-se cidadã mexicana. Nos anos 50, assim como Ramón, ela participou de muitos filmes. E também atuou em telenovelas.

Ramón
 se destacou muito nos filmes e foi convidado por Pedro Almendriz para filmar "Mulata" (1954). Logo depois, o cineasta Pedro Infante o convidou para participar de "La Vida no Vale Nada" (1955). Neste mesmo ano, Angelines Fernández atua em "Maternidad Imposible". O destino de Ramón e Angelines já preparava um primeiro encontro ainda no cinema. 

María Antonieta de las Nieves, aos 18 anos, apresentando "Super Gênios da Mesa Quadrada"
Em 1956, María Antonieta de las Nieves, a Chiquinha, estreava como atriz mirim, com apenas seis aninhos, pois é, pois é, pois é! Foi no programa de TV "Teatro Fantástico": montagens infantis especiais para a televisão criadas por Enrique Alonso "Cachirulo".

María Antonieta Gómez Rodríguez nasceu dia 22 de dezembro de 1950, em Nayarit, no México. É a caçula de sete irmãos e a mais jovem do elenco de Chespirito. E também foi a que começou a atuar mais cedo. Já aos sete anos, trabalhou dublando filmes e séries americanas. No mesmo ano (1957), atuou em seu primeiro filme: "Pulgarcito".
1958 foi um ano muito importante porque foi o ano em que, sem querer querendo, Bolaños virou "Chespirito". Convidado por dois grandes comediantes do cinema mexicano, Viruta e Capulina, Roberto escreveu o filme "Los Legionarios", que foi dirigido por Augustin Delgado. Fascinado pelo roteiro de Bolaños, Augustin deu-lhe a alcunha de "Shakespearito", isto é, pequeno Shakespeare. O nome pegou e foi adaptado para CHESPIRITO.

Roberto Gómez Bolaños "Chespirito" nasceu em 21 de fevereiro de 1929, na Cidade do México. Estudou engenharia, mas se dedicou às artes - a todas elas: literatura, música, teatro, desenho, programas de televisão e cinema. Criou, interpretou, escreveu, produziu e dirigiu todo o universo de Chaves & Chapolin.

Após o sucesso de "Los Legionarios", Chespirito foi chamado por Tin Tan Valdés para escrever o roteiro de seu novo filme, "Millonario y vagabundo".

O talento da dupla Viruta e Capulina se somou aos roteiros incríveis de Chespirito em vários outros filmes, até que ele foi convidado também para atuar em "Dos Criados Malcriados". Foi a primeira vez em que Chespirito fez um papel - e não foi de animal!

Chespirito contracenando com Viruta y Capulina  em "Comicos y Canciones" nos anos 60
Chespirito já era fã de Tin Tan e queria escrever mais roteiros para ele. Ramón e Manuel "El Loco" também lhe chamavam a atenção, com suas participações cada vez mais brilhantes nos filmes do irmão. Fascinado pelo trabalho dos irmãos Valdés, Chespirito escreveu dois roteiros especiais para Viruta e Capulina. No primeiro, atuou Manuel "El Loco" Valdés: "Dos Tontos y un Loco" - este "Loco" é o próprio "El Loco" Valdés. O segundo foi "En Peligro de Muerte", no qual atuaram Ramón e Tin Tan. Eis aí o primeiro encontro entre os gênios Roberto Gómez Bolaños e Ramón Valdés. O início de uma parceria fundamental para o sucesso de Chaves & Chapolin.

Nos anos 60, Ramón e Angelines já eram atores de cinema reconhecidos, chegando a trabalhar com Cantinflas, considerado o rei da comédia latina - até então!




Os Super Gênios da Mesa Quadrada: o embrião das séries CH

Em 1968, Chespirito conquistou um espaço próprio na então TV TIM (canal 8), dentro de um programa semanal ("Sábados de la Fortuna"). Foi aí que começou a sua carreira na televisão, criando logo de cara dois programas que bateram todos os recordes de audiência: "Cidadão Gómez" e "Os Supergênios da Mesa Quadrada", no qual ele formou o seu primeiro grupo de atores, com Ramón Valdés (Seu Madruga), Rubén Aguirre (o Professor Girafales) e María Antonieta de las Nieves, a Chiquinha. Chespirito interpretava o Doutor Chespirito Chapatin, que não era médico e sim doutor acadêmico. María Antonieta, chamada pelos companheiros de "Marioneta", apresentava o programa. Ramón Valdés fazia um bêbado; e Rubén deu vida ao professor Rubén Aguirre Girafales, que foi, portanto, o primeiro personagem de "Chaves" a ser criado, ainda que só fosse um esboço do Mestre Linguiça.

Com o grande destaque desses dois programas, Chespirito ganhou um espaço maior, um programa só pra ele! E assim nasceu, em 1970, o primeiro programa "Chespirito". Foi dentro dele que o Chapolin apareceu pela primeira vez, em 1970. E o Chaves, em 1972. Devido ao enorme sucesso desses dois personagens, eles ganharam um programa próprio cada um. Em 1973 foram ao ar os primeiros episódios de Chapolin e Chaves.  no origilan era el chavo del ocho, por causa do canal onde era exibido[8] E depois que a Televisa comprou o canal, os seriados migraram para o canal 2 - e o número 8 passaria a ser justificado, no programa, pelo número da casa na qual o Chaves supostamente morava. Afinal, como o próprio garoto diz, ninguém pode morar em um barril. No entanto, como em tantos outros mistérios do programa, a tal casa de número 8 jamais apareceu. 


"Chaves": um fenômeno mundial

CHAVES é um sucesso impressionante em todos, todos, todos os países da América Latina! Foi o único programa que conseguiu ficar, pelo menos uma vez, em primeiro lugar de audiência em cada país em que foi exibido. No Brasil, um dos poucos programas do SBT que já conseguiu bater a Rede Globo no Ibope foi o Chaves - e isso levando em conta que foram reprises! Até hoje, desde que entraram na TV brasileira, em 1984, no programa do Bozo, são repetidos incansavelmente os mesmos cerca de 300 episódios, somando "Chaves" e "Chapolin" - e ainda com altíssimos índices de audiência. 

Mas CHAVES não ficou só na América Latina; ultrapassou barreiras inesperadas. Foi dublado em alemão, russo, japonês, árabe, coreano, italiano... E passa legendado em inglês nos EUA até hoje! CHAVES conquistou o mundo - e foi o único programa humorístico latinoamericano que conseguiu isso. CHAVES foi muito além dos mexicanos Cantinflas e Tin Tan Valdés; e muito além dos mais bem sucedidos comediantes brasileiros como Mazzaropi, Oscarito, Grande Otelo, Os Trapalhões, Chico Anysio ou qualquer outra grande referência do humor latino.

Para mim, havia algo que brilhava neles que ultrapassava as barreiras possíveis. Aconteceu com eles na televisão o que aconteceu com os Beatles na música, guardadas as proporções... Mas é uma comparação bem razoável. CHAVES inspira as pessoas até hoje. Os fãs se referem aos atores como deuses do humor. As pessoas se lembram deles ou se referem a eles pelo que representaram: o melhor grupo de atores comediantes dos anos 70 - e de sempre.


As duas almas da série "Chaves"

 este parágrafo 4 é dedicado a dois dos atores de maior talento em Chaves & Chapolin, na minha opinião: Ramón Valdés (Seu Madruga), que para mim é o melhor ator das séries CH, e Carlos Villagrán, o Quico. Eles se destacaram demais e isso trouxe consequências...

Carlos Villagrán Eslava, também conhecido por "Pirolo", deixou o elenco de Chespirito em 1978, no auge do sucesso dos programas Chaves e Chapolin. E isso, é claro, foi prato cheio pra mídia sensacionalista, que começou a espalhar vários boatos sobre as circunstâncias em que se deu a saída de "Quico". O mais aburdo deles, por acaso o mais difundido de todos e no qual muitas pessoas acreditam até hoje, foi dizer que ele saiu porque brigou com Chespirito por causa da atriz Florinda Meza, a Dona Florinda. Os fofoqueiros de plantão adoram dizer que Carlos Villagrán e Florinda Meza já foram casados, o que não é verdade. O único casamento real é o de Chespirito com Florinda. Dizer que "o Chaves roubou a Dona Florinda do Quico" foi a notícia de que muitos jornalistas sem ética precisaram para ganhar dinheiro fácil. O próprio Villagrán jamais confirmou essa fantasiosa história de triângulo amoroso. Se ele já teve ou não qualquer coisa com Florinda, no passado, é algo extremamente pessoal, que não tem a ver com seu trabalho nas séries de Chespirito.

Houve, de fato, uma insatisfação muito grande, não só de Chespirito, mas de todo o elenco com Carlos Villagrán por ele ter saído para ganhar dinheiro sozinho como "Kiko". "Chaves" era como uma família e a saída de um membro representava, portanto, algo muito grave.

Após deixarem a série, Ramón e Carlos atuariam juntos duas vezes, em séries protagonizadas pelo personagem "Kiko"
Meses após a saída de Villagrán, o elenco de Chespirito foi novamente desfalcado de maneira irreparável: Ramón Valdés, o Seu Madruga, tão querido pelos fãs e pelos próprios atores, também deixou a Televisa e foi atuar junto com Villagrán nos programas "Kiko", gravados na Venezuela.

Carlos Villagrán foi tentar a carreira solo com seu próprio programa, "Kiko". Para poder representar o personagem legalmente, Villagrán registrou o personagem com K, Kiko, para ficar diferente do Quico idealizado e criado por Roberto Gómez Bolaños. Isso certamente piorou o clima entre os dois atores, que deixaram de se falar.

Ramón, por sua vez, jamais brigou com nenhum integrante do elenco, muito menos com seu grande amigo Chespirito. Tanto que houve uma época, nos anos 80, em que Ramón retornou ao elenco de Chespirito para gravar participações especiais. Ramón Valdés sempre foi muito querido por seus companheiros de trabalho, que se lembram dele com muita saudade e carinho: Seu Madruga nos deixou em 1988.

Dona Neves e Jaiminho foram chamados para suprir a ausência da dupla
É justo dizer que a ausência de Ramón Valdés e de Carlos Villagrán no elenco de Chespirito comprometeram a vida dos programas Chaves e Chapolin. Ao lado de Chespirito eles são, sinceramente, os melhores comediantes, os mais marcantes. Sem Quico e Seu Madruga, a vila do Chaves fica vazia e sem graça. A energia de antes desaparece na falta dos dois. Chespirito logo percebeu isso e tratou de fugir da vila, criando novas histórias locadas em outros cenários: o parque, a casa do Sr. Barriga e, claro, o restaurante da Dona Florinda, para onde o núcleo da história foi desviado por muitos episódios. Chespirito jamais pensou em substituir Quico ou Seu Madruga, mas criou novos personagens para dar uma força. Um deles foi Jaiminho, o carteiro, interpretado por Raúl Padilla. E pra Chiquinha não morar sozinha, sua "biscavó" entrou na história: Dona Neves, interpretada pela própria María Antonieta de las Nieves.

Mas a perda de força do programa foi visível e, ainda em 1979, terminaram as gravações dos programas Chaves e Chapolin. Isso não significou, no entanto, o fim dos personagens. Graças ao seu brilhante texto, que é o fator principal para o sucesso de um programa de TV, Chespirito continuou vestindo o Chaves e o Chapolin, mas dessa vez em quadros menores, dentro do novo "programa Chespirito", que foi ao ar em 1980. A criatividade infinita de Bolaños permitiu que ele se dedicasse a novas obras e personagens completamente novos. Nasceram os quadros de "Los Caquitos", com a volta dos bandidos Chômpiras e Botijão, interpretado pelo Edgar Vivar, o Sr. Barriga - e com a melhor atuação de Florinda Meza, a engraçadíssima Chimoltrúfia. E "Los Chifladitos", com a maior dupla humorística de todos os tempos: O Alto e o Baixo, ou melhor, Chaparron e Lucas Pirado, interpretado pelo Rubén Aguirre, o professor Girafales. O Doutor Chapatin, que foi o primeiro personagem CH interpretado por Chespirito, também ganhou um quadro só pra ele. E foram produzidos muitos outros quadros especiais e esquetes com um elenco de primeira, que ainda contou com Moises Suárez e Anabel Gutiérrez.

o ator Ramón Valdés faleceu em 9 de agosto de 1988, aos 65 anos. Tão querido no mundo inteiro e adorado por todos 

Apoia
do por seu irmão mais velho Germán "Tin Tan" Valdés, Ramón começou sua carreira de ator no cinema, nos filmes do próprio Tin Tan. A partir de então, participaria de mais de 50 filmes. Antes disso, ele chegou a trabalhar como comerciante, vendedor, motorista... Fazia de tudo, afinal... Não existe trabalho ruim! O ruim é ter que trabalhar. Nesse começo difícil, ele chegou a trabalhar até como carpinteiro, como nos episódios de "Chaves"... E foi muito ajudado financeiramente por Tin Tan.

Seu talento e seu pontencial foram logo percebidos por Roberto Gómez Bolaños, que o convidou para integrar o elenco de "Os Supergênios da Mesa Quadrada".

Ramón Valdés foi meu comediante favorito. Ninguém me fez rir tanto como Ramón Valdés. A morte dele me afetou muito, éramos muito amigos.” Chespirito fez esse pronunciamento em mais de uma ocasião. Sempre que lhe perguntam sobre Ramón, como que instantaneamente seus olhos se enchem de lágrimas e se perdem em lembranças tão nostálgicas quanto belas. Bolaños não se cansa de lembrar que Ramón Valdés foi seu comediante preferido. Tal declaração é, para aquele que é considerado o gênio da comédia, de uma importância incalculável. É o grande mestre da comédia elegendo o seu melhor comediante, aquele que também pode ter sido seu melhor amigo.

Não é só Chespirito que se emociona ao lembrar Ramón Valdés. Todo o elenco se recorda dele como um grande amigo, um irmão ou até mesmo um pai. De personalidade ambiguamente forte e simples, sabia cativar com seu jeito humilde e, principalmente, com seu bom humor. Para incorporar o Seu Madruga, ele só precisava de uma calça jeans, uma camisa preta, um par de tênis branco e um chapéu. Estava pronto, ou seja, era basicamente ele mesmo! Chegava atrasado nas gravações, falha que compensava com seu talento primoroso. Interpretava tão naturalmente que é difícil separarmos o ator do personagem. Dono de um tempo de comédia raríssimo e certeiro, era capaz de fazer os companheiros de trabalho (elenco e equipe técnica) se acabarem de rir durante as gravações.

Depoimento de Esteban Valdés, filho de Ramon Valdés:
"O que Chespirito viu em meu pai foi um talento natural. Ele era daquele jeito mesmo, usava jeans sempre, uma camisa de algodão simples e fresca, tênis... E era muito engraçado. Por isso, Chespirito quis apenas que meu pai fosse ele mesmo no show... Nem precisou trocar de nome!"

É difícil dizer com qual dos atores o Seu Madruga se dava melhor. Todos falam tão bem dele e lembram-no com tanta saudade... Carlos Villagrán, o Quico, disse uma vez:

— Nós tínhamos uma amizade tão forte, uma cumplicidade que não se pode calcular. Éramos muito unidos, de tal forma que ninguém pode entender. Até hoje não parei para pensar na sua morte. Para mim seria o fim.

São palavras fortíssimas, de grande apelo emocional, beirando o delírio. Observem a carga dramática do depoimento: como é grave o sofrimento de Carlos Villagrán ao se lembrar do amigo! Amigo que o acompanhou quando deixou para trás o elenco de “Chaves” e a Televisa. Amigo que chegou a atuar só com ele em outros seriados.

O curioso aqui é que Carlos, ao deixar o programa de Chespirito, em outubro de 1978, saiu brigado com todos os seus ex-companheiros, à exceção, obviamente, de Ramón. Este, no entanto, retirou-se do elenco, poucos meses depois, para ir trabalhar com Carlos em outro seriado, porém sem brigar com Chespirito e os demais companheiros. Tanto que, três anos depois, voltou para o elenco de Bolaños. Contudo, ficou só mais alguns meses. Em recente entrevista, Esteban Valdés revelou que um dos motivos que levou seu pai a deixar o programa definitivamente foi sua insatisfação com as intervenções cada vez mais graves de Florinda Meza em todas as questões que envolviam o programa.

Depois que saiu de vez do elenco de Chespirito, Ramón aproveitou para viajar com seu circo e conheceu muitos países.

Em 1987, ele regressou ao México e se uniu novamente ao amigo Carlos Villagrán. Juntos gravaram o programa "Ah que Kiko!", do canal 13, em que ele era outra vez "Don Ramon". Segundo Esteban Valdés, isso não representou problema algum com Chespirito, já que Don Ramón era basicamente ele mesmo e não poderia ser impedido de usar um personagem com seu próprio nome. "O meu pai era sempre Don Ramón, com ou sem Chespirito". 

Carinho de um pai para uma filha, em sentimento além da ficção
“Assim como no seriado, na vida real também era como um pai para mim. Ele me beijava na testa e me chamava de Chiquinha (Chilindrina) mesmo.” – lembra María Antonieta de las Nieves, a Chiquinha, que realmente poderia ser filha de Seu Madruga, já que a diferença de idade entre os dois é de 25 anos. “Quando ele morreu, a Chiquinha chorou diariamente por um bom tempo”, recorda-se.

María Antonieta e Ramón Valdés atuaram juntos desde o final dos anos 60, ao lado de Chespirito.

No mesmo dia da morte de seu “papito lindo”, Chiquinha fez um show para milhares de pessoas em homenagem ao ator. Terminado o espetáculo, não pôde conter o choro enquanto cantava uma música especial que ela mesma escreveu para ele. 

Edgar Vivar se emocionou ao falar do amigo
E quem não se lembra do triste depoimento de Edgar Vivar (Sr. Barriga) para a equipe de Sônia Abrão no programa Falando Francamente, sobre a morte de seu amigo? Edgar não conteve as lágrimas. Considerou o fato como o pior episódio de que pode se lembrar de toda a sua carreira.

Edgar regressava de uma viagem à Guatemala quando, enquanto ainda descia do avião, recebeu a notícia trágica. As pessoas gritavam: “Senhor Barriga, o Seu Madruga morreu! O Seu Madruga morreu!”. Foi um choque muito grande, conta o ator, os olhos cheios d’água.

— Havia muitíssima gente no enterro. Gente do meio artístico e também o povo; todos foram se despedir de Don Ramón. Quando o enterraram, as pessoas começaram a aplaudir...

A fala de Edgar Vivar é interrompida por um silêncio doloroso e interminável. Quando esteve no Brasil e foi entrevistado por Sônia Abrão, Edgar lembrou, a pedido dos fãs, os bons tempos com o amigo. Na maioria das vezes, eles saíam juntos após as gravações, já que moravam muito perto. “Às vezes eu dirigia, outras vezes era ele. Eu freqüentava a casa dele e adorava seus filhos. Ele também freqüentava a minha casa. Éramos muito amigos”.

Contudo, possivelmente quem mais sofreu com a morte do ídolo Ramón Valdés foi sua inseparável amiga Angelines Fernández, a Dona Clotilde, que também já faleceu. Poucos sabem, mas Angelines e Ramón já se conheciam tempos antes dos programas de Chespirito, pois eram renomados atores do cinema mexicano dos anos 50 e 60. Aliás, foi Ramón quem apresentou a atriz a Chespirito. Ela estava interessada em integrar o elenco de Bolaños e foi falar com Ramón, perguntando se Chespirito não tinha algum papel para ela. Foi assim que ingressou nas séries de Chespirito e nunca mais saiu.

— A morte do Don Ramón foi uma tragédia para a minha família. Minha mãe nunca mais foi a mesma, entrou em depressão e morreu poucos anos depois – disse Paloma Fernández, filha única da atriz que ficou reconhecida mundialmente como a Bruxa do 71, em entrevista a uma revista venezuelana.

— Ela descuidou da saúde, passou a fumar ainda mais. Nunca aceitou a morte do Don Ramón. Eram muito ligados, se amavam muito – completa Paloma. 

Uma dupla inseparável
Angelines Fernández morreu em março de 1994, do mesmo mal que matou Ramón Valdés: o fumo. Os dois fumavam descontroladamente. Conta-se que, no enterro de Ramón, Angelines foi a última a ir embora do cemitério. Ela ficou ao lado do túmulo o dia inteiro, chorando, inconformada. Dizem também que ela não parava de falar, como se estivesse conversando com Ramón.

Mas Angelines continuou a gravar os programas de Chespirito até o ano de sua morte. Comparando a fase antiga com a recente, é assustadora a mudança física por que passou a atriz. Antes magérrima, engordou consideravelmente, além de estar visivelmente abatida nos programas mais novos. De fato, a morte de Ramón mexeu muito com ela e, como disse sua filha, a atriz nunca mais foi a mesma. Morreu seis anos depois, de câncer no pulmão.

Esteban Valdés:
"O câncer começou na coluna vertebral... Ele estava no Peru em 1985 quando começou a sentir dores muito fortes na coluna. Voltou para o México e os médicos já diagnosticaram o câncer terminal. Foi descoberto tarde demais e já estava espalhado por todo o corpo. Mas ele nunca parou de fumar nem de beber. Os médicos lhe deram seis meses de vida, mas ele ainda viveu três anos e meio!"

Ramón foi internado em julho de 1988 e morreu no dia 9 de agosto, após sofrer uma parada cardíaca.

Jornal anuncia morte de Ramón Valdés
Deixou 10 filhos. Sua última mulher foi a atriz e cantora Aracely Julián, irmã da também artista Rosalía, a mulher de Tin Tán Valdés! As irmãs Julián eram um trio famoso de cantoras de rádio, "Las hermanitas Julián", que conquistaram o coração dos irmãos Valdés...

Ramón alcançara fama nacional no cinema, mas conquistou fama mundial com o personagem Seu Madruga da série de Roberto Bolaños. Seu último trabalho na TV foi ao lado de Carlos Villagrán, na série ‘Ah, que Kiko!”.

Os fãs também sentem saudade... Nosso querido Seu Madruga! Tão amado, tão vivo! Vivo, sim, porque sua imagem está eternizada nos seriados. Como disse em certa ocasião seu dublador no Brasil, Carlos Seidl: “Parece que ele não morreu, pois sua imagem está ali, viva, e ainda nos faz rir.” É isso mesmo. Seu Madruga vive para sempre em nossas memórias e em nossas casas quando ligamos a TV para assistir ao ‘Chaves’. Ele vive cada vez que sorrimos por sua causa. Cada vez que nos faz rir! Porque quando nos faz rir, nos faz viver melhor. E se nos faz viver melhor, é porque também está vivo! 



A nação chavesmaníaca perdia Godinzinho

Neste ano começaram os preparativos para a grande homenagem a Chespirito pelos 30 anos de seus programas de TV (em particular o trigésimo aniversário de Chapolin, que foi criado em 1970) e meio século de carreira (e ainda se lembra?)! Desgraçadamente, em 21 de novembro de 1999, Horácio Gómez, o Godinzinho, seu irmão e empresário, morreu no México, de uma parada cardíaca. Foi um golpe muito forte para Chespirito e sua família. Seu filho, Roberto Fernández, passou a cuidar de seus negócios e a defender seus interesses e direitos artísticos junto à Televisa. 

Vale destacar aqui algo que os fãs brasileiros não têm muita noção, por conta da falta de informações e interação com fãs de outros países há uma década. Após o término do programa Chespirito, em 1995, houve uma fase de certo descontentamento entre Chespirito e a Televisa. Esta emissora revolucionou toda a sua programação com o acréscimo de diversos programas novos, muitos deles apelativos, de humor chulo, que foram duramente criticados por Chespirito. Afinal, ele estava fora da grade de programação da Televisa e seus programas não estavam reprisando lá (só em outros países). 

Portanto, enquanto outros países viviam, cada um em seu momento, o ressurgimento de Chespirito, com as reprises áureas dos programas dos anos 70 e a exibição de episódios dos anos 80 e início dos 90 como "novidade", no México o programa Chespirito era visto com outros olhos: como uma atração que chegara ao fim, dando espaço a novos programas. Quando acabou em 95, o programa saiu do ar e não foi reprisado imediatamente. Chespirito e os demais atores ficaram ausentes da TV. Vale lembrar que, neste período, Chespirito estava fortíssimo no teatro, com sua peça 11 y 12 ao lado de Florinda Meza. Os demais atores viajavam mundo afora com seus personagens, apresentando-se em circos em dezenas de cidades de vários países.

Houve uma mudança total na estrutura administrativa da Televisa nos anos 90 e Chespirito se sentiu deixado de lado ou mal aproveitado, pois as novas programações priorizavam programas de qualidade duvidosa, porém apelativos em algum sentido (ou em todos), o que rendia bons índices de audiência (este fenômeno não se deu só no México, mas em toda a América Latina: as programações, aos poucos, foram se transformando, a partir dos anos 90, numa espécie de fast food, totalmente comercial, em padrão repetitivo e nada original).

Chespirito lamentou isso, pois, para ele, o que é visto na TV pode ser comparado à comida: assim como faz bem pra saúde alimentar-se bem, é igualmente bom pra saúde assistir a coisas de qualidade na TV, principalmente programas feitos para divertir e entreter. "Caiu-se no vulgar e os programas já não tem a mesma graça de antes", afirmou Chespirito, em 1999. Florinda Meza, escritora e produtora de telenovelas, também sentiu o mesmo efeito: "Falta criatividade", ela disse.

Roberto e Florinda passaram a criticar a qualidade dos programas da Televisa (e da TV em geral), ao mesmo tempo em que se viam afastados da programação, porém mais atuantes do que nunca no teatro e com a peça 11 y 12 rendendo as maiores bilheterias da história do teatro latino. Só no México, eles ficaram 8 anos consecutivos em cartaz no mesmo teatro Libanés, com mais de 2700 apresentações, todas cheias. 



Com o fim das séries, o casal passou a mostrar sua versatilidade

Certamente, no teatro, Chespirito e Florinda puderam trabalhar de maneira muito mais independente e aproveitar o sucesso de seu trabalho ao vivo, com os altos lucros de uma bilheteria bem sucedida, do que na própria televisão (onde a emissora é quem mais lucra diretamente com o trabalho artístico). Por algumas vezes, Chespirito foi roubado por empresários de teatro gananciosos. Um trabalho artístico de sucesso, quando não é bem administrado, é alvo de muitos golpes - por todos os lados. Mas o fato é que, no teatro, Chespirito provou ser um ator completo, dono de um dom artístico capaz de brilhar onde estiver, seja qual área for. E fazer arte (e fazer rir!) ao vivo é muito mais difícil e desafiador.

Em 1999, Carlos Villagrán deu pela primeira vez a declaração de que o personagem Quico foi mais popular que Chaves, o que criou grande polêmica e foi prato cheio para dezenas de veículos de comunicação sensacionalistas. A partir daí, a mídia exploraria incansavelmente a saída de Villagrán dos programas de Chespirito (em 1978) e colocaria os dois como grandes inimigos. "Começaram a me chamar para gravar discos, comerciais, campanhas publicitárias e outras coisas. Os outros não gostaram disso e quiseram sacrificar meu personagem. Aí quem não gostou fui eu e deixei o programa definitivamente", afirmou Villagrán. De fato, desde que saíra do programa, os dois atores pararam de se ver e de se falar e não tiveram mais nenhum tipo de relação ("nem para bem nem para mal", como sempre afirma Villagrán).

Por conta de sua saída do programa, Villagrán considera que nunca mais foi chamado para trabalhar na Televisa. Nessa época, ainda, María Antonieta de las Nieves, a Chiquinha, estava sem trabalho na emissora - seu último trabalho foi o programa "Aqui está la Chilindrina" (1995). De maneira geral, todo o elenco de Chaves estava fora da TV nesta época e fazendo trabalhos ao vivo pela América Latina, porém sem contratos com a TV (com exceção de Chespirito, cujo contrato com a Televisa era e é permanente). Até Florinda Meza chegou a deixar a emissora e ficou sem contrato de trabalho.

Aposto que nenhum deles tinha noção de que entrariam no século 21 com popularidade inabalada e até maior do que terminaram a década de 1990, sendo ainda mais reconhecidos e adorados, ano após ano.


Ano 2000
30 anos de astúcia


Finalmente chegou o momento da maior homenagem a Chespirito já realizada na televisão: Televisa, ano 2000. Trinta anos após a primeira aparição do Chapolin Colorado na televisão. A emissora rendeu um dia inteiro de homenagem em uma programação especial só com programas dedicados a Chespirito. A Televisa, por um dia, virou literalmente o "Canal do Chapolin".


O histórico reencontro de Chespirito e Villagrán depois de mais de 20 anos

Conseguiram reunir todo o elenco nesta homenagem: Chespirito, Florinda, Edgar Vivar, Rubén Aguirre, María Antonieta de las Nieves... E até Carlos Villagrán compareceu para dar um abraço em Chespirito. Este reencontro dos dois foi o acontecimento mais marcante do evento. E mesmo que para muitos tenha soado artificial (ou superficial), ninguém pode discordar de que foi um momento emocionante e tão esperado, de grande felicidade para todos os fãs.

O evento contou com a participação de vários artistas da Televisa, que foram prestar sua própria homenagem ao ídolo de gerações Chespirito. Atores, cantores, produtores, funcionários e diretores, todos juntos para celebrar a genialidade de Roberto Gómez Bolaños, exemplo para artistas de todas as idades, dentro e fora do México. E como não lembrar do concurso de sósias que reuniu os melhores cosplayers dos personagens da vila (e do Chapolin), de várias idades e nacionalidades distintas?

Todos ainda puderam sentir a presença de Ramón Valdés, Angelines Fernández, Raúl Padilla e Horácio Gómez, os velhos companheiros que se foram, mas que permanecem vivos em nossos corações e com sua arte exposta diariamente na TV. Eles foram lembrados e homenageados também.

Sem dúvidas, esta grande homenagem a Chespirito e a seu legado gerou mais um "revival" no México, que pouco tempo depois retomaria as exibições de todos os programas de Chespirito, e em todo o mundo, culminando com mais uma gloriosa chavesmania (como vimos, ela acontece de tempos em tempos, como ocorre com todos os grandes clássicos ao longo da história) no começo do novo século.

Todos os atores se beneficiaram disto e foram convidados para novos trabalhos, alguns dentro da própria Televisa, como Vivar e Antonieta, que participariam de telenovelas nos anos 2000. Rubén Aguirre foi convidado para apresentar um programa de concursos de sucesso na Televisa. Todos, enfim, mereciam um pedacinho daquela homenagem a Chespirito, pois contribuíram diretamente para a consagração de seus programas.



Um ilustre fã de Bolaños: Diego Armando Maradona

O futebolista Diego Armando Maradona, em fase de recuperação das drogas, declarou-se fã de Chespirito e teve a oportunidade de agradecer pessoalmente a seu ídolo pelos anos de risadas com seus programas. Chespirito, apaixonado por futebol e grande admirador de Maradona, ficou muito feliz e orgulhoso. "Meu ídolo é o Chaves" - disse Maradona. "Quando estou deprimido, assisto ao Chaves, não existe programa mais lindo e mais puro do que este".

No Brasil, neste mesmo ano, um falsário se passou por Bolaños dizendo ser o Chaves da TV. Ele chegou a realizar alguns shows em cidades do interior do Brasil. Era um tal de Juan Carlos Alavos, que preparava uma série de shows na Baixada Fluminense quando foi descoberto por um jornalista do jornal O Dia, Élcio Braga. Élcio descobriu a farsa porque a própria produtora de Bolaños, Beatríz Leonz, desmentiu tudo, dizendo que o verdadeiro e único "Chaves" estava no México em cartaz com a peça 11 y 12. Juan Carlos chegou a ter a cara de pau de mostrar à imprensa um documento falso, com assinatura do Bolaños, que lhe permitia vestir-se de Chaves, além de dizer que tinha gravado alguns programas (o mesmo papo de Roberto Vásquez, o falso Kiko). Mas a reportagem dO Dia descobriu tudo e denunciou o safado e seu empresário 171.

Mesmo assim, muita gente boa ainda pensava, nessa altura do campeonato, que o Chaves e boa parte do elenco tinham morrido em um acidente de avião. Acho que até Bolaños voltar a dar as caras numa entrevista brasileira, em 2001, a maioria das pessoas ainda acreditava naquele boato. A partir de 2001 e com a proliferação dos sites de fãs e criação de fóruns também, estava definitivamente ressuscitado o elenco de Chaves no Brasil e caía, por fim, o boato do acidente de avião, entre outros absurdos.



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